Eles serão menos hostis em relação ao Ocidente e menos desestabilizadores
Alexandre Marinis
Graças a Chávez, o hemisfério sofrerá com o declínio econômico que normalmente segue-se à estatização
O mundo deveria aguardar ansioso pela próxima geração de líderes latino-americanos. Eles serão menos hostis em relação ao Ocidente e menos inclinados a desestabilizar seus vizinhos. Os atuais líderes da região formaram suas visões políticas lá nos anos 60 e 70, quando os Estados Unidos apoiavam golpes militares para evitar a disseminação do comunismo além das fronteiras de Cuba.
Os futuros líderes da América Latina cresceram vendo o muro de Berlim cair na TV e celebrando o Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta, na sigla em inglês). Conhecem um EUA diferente, que não precisa mais intrometer-se nos assuntos da região para certificar-se de que o capitalismo prevalecerá sobre o comunismo.
Em seu livro "Os Ciclos da História Americana", de 1986, Arthur M. Schlesinger Jr. - ex-auxiliar do presidente John F. Kennedy, contrário à invasão da Baía dos Porcos, em Cuba - afirma que a história dos EUA vive ciclos de 30 anos, entre o interesse privado e o propósito público, o livre mercado e o governo ativista, o capitalismo e a democracia, republicanos e democratas.
Hoje, com a crise financeira mundial fazendo o pêndulo da história afastar-se dos mercados excessivamente desregulados e oscilar em direção aos braços de um governo maior e do capitalismo keynesiano, vale à pena revisitar a ideia de Schlesinger a partir de uma perspectiva internacional.
Uma de suas notáveis ideias reveladoras é que as gerações são delineadas por eventos históricos cruciais que acontecem enquanto os adultos jovens adquirem sua consciência ou identidade política. Esses eventos, que moldam corações e mentes, proporcionam uma visão de mundo que as pessoas compartilharão por toda a vida.
Para os líderes na América Latina, esses eventos-chave incluíram a luta contra regimes militares opressores apoiados por um Tio Sam imperialista. Agarrados ao passado, eles aferram-se à única exigência com a qual conseguem concordar - o fim do embargo de Washington a Cuba -, enquanto assuntos críticos permanecem negligenciados. Deveriam preocupar-se, por exemplo, com as consequências políticas e econômicas que o sentimento neopopulista do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, cultiva por toda a América do Sul e Central. Mesmo moderados respeitados, como os presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e do Chile, Michelle Bachelet, deixam de criticar Chávez por alimentar as flamas da tensão e discórdia na região.
Contando com petrodólares e uma força militar poderosa, a autoproclamada revolução socialista de Chávez influenciou o recente golpe de Estado em Honduras e a remilitarização da região, incluindo o conflito entre Colômbia e Equador em 2008, que quase terminou em guerra. E, graças a Chávez, o hemisfério sofrerá com o declínio econômico que normalmente segue-se à estatização de empresas privadas confiscadas, com o prolongamento excessivo dos mandatos presidenciais desfrutado apenas por ditadores e com a restrição da liberdade de imprensa.
A liderança de Chávez se fortalece em função do vácuo político deixado pelo Brasil, maior país da região. Mesmo com seus discursos apaixonados, Lula não pronunciou uma palavra sequer sobre as crescentes evidências de que Chávez teria fornecido armamentos às Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), grupo terrorista envolvido com os barões das drogas. Lula também não respondeu às crescentes evidências de que Chávez financiou, de forma ilegal, campanhas políticas na Argentina e Equador, entre outros lugares. Em 2002, documentos da Abin, o serviço nacional de inteligência brasileiro, sugeriram que o Partido dos Trabalhadores, de Lula, poderia ter recebido US$ 5 milhões das Farc. As acusações nunca foram provadas. Na semana passada, Lula disse estar preocupado com o plano do governo da Colômbia de dar acesso aos EUA a sete bases militares para operações contra traficantes de drogas ilegais e os guerrilheiros das Farc. Lula parece concordar com Chávez, que vê o acordo entre Colômbia e EUA como uma "agressão" que deve ser contida com a compra de "vários batalhões" de tanques de fabricação russa.
Lula, contudo, não se opôs ao exercício naval conjunto promovido por Venezuela e Rússia em 2008, que envolveu 16 navios de guerra e 1,6 mil marinheiros russos no Caribe. Durante o exercício, um destróier tornou-se o primeiro navio de guerra russo a cruzar o canal do Panamá desde a Segunda Guerra Mundial. Lula e outros líderes latino-americanos, portanto, parecem ter dois pesos e duas medidas no que se refere a ações militares.
E isso não é nada comparado a Daniel Ortega, da Nicarágua, que acusou as agências de inteligências dos EUA, agindo sem aval do presidente Barack Obama, de terem planejado o golpe que depôs o presidente Manuel Zelaya, de Honduras, em junho. Ortega, claro, não observou a intervenção dos EUA apenas como um jovem na América Latina. Ele liderou o governo sandinista na batalha contra os rebeldes financiados pelos EUA nos anos 80.
"O continente precisa deixar o antiamericanismo para trás, um sinal de imaturidade em minha visão", disse o vice-ministro de Defesa da Colômbia, Sergio Jaramillo, em entrevista ao jornal brasileiro "O Estado de S.Paulo". Jaramillo, de 42 anos, soa mais razoável do que líderes latino-americanos mais experientes. Sua visão de mundo foi formada enquanto estudou no Canadá, Inglaterra, França e Alemanha no fim da década de 80 e início da de 90, quando a Guerra Fria já acabava.
As teorias de Schlesinger merecem ser revisitadas. Explicam o que ocorre no mundo de hoje e como a América Latina mudará para melhor quando as gerações futuras assumirem o controle.
Alexandre Marinis é colunista da "Bloomberg News".
Fonte:http://www.portaldoeconomista.org.br/noticias/os-proximos-lideres-latino-americanos.html
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